sábado, maio 20, 2017

O sistema político português: comentários*

Comentário à entrevista, transcrita quase integralmente, a Manuel Braga da Cruz sobre o seu livro "O sistema político português", publicada aqui

Comentários meus a negrito e entre [].
O professor de Política Comparada da Universidade Católica vai lançar um ensaio sobre a reforma do sistema político, publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, em que defende o desmembramento do Parlamento em duas câmaras com eleições mistas - uma parte por sistema maioritário (uninominal) e outra por sistema proporcional, em ambas as câmaras - o fim da eleição directa do Presidente da República e a quase impossibilidade de dissolver o Parlamento ou demitir o Governo. 
Diagnostica o risco de esgotamento do sistema político português? Que sintomas vê?
É manifesto um certo afastamento dos cidadãos em relação à vida política, alguma perda de confiança nas instituições políticas – há muitos estudos de opinião que o confirmam. Mas há também indicadores objectivos, como o aumento da abstenção, muito acima do que é normal em democracias consolidadas. Mas há mais: um certo fechamento e oligarquização dos partidos políticos. O recrutamento que os partidos estão a fazer não é o dos mais qualificados. Por outro lado, temos uma ancoragem cada vez mais forte dos partidos ao Estado por via do financiamento e um distanciamento progressivo à sociedade civil. No sistema governativo, temos sinais insistentes de tensões entre os órgãos de governo que impedem a boa governabilidade do sistema e suscitam frustrações. Passaram 40 anos [sobre a aprovação da Constituição... a dos EUA tem mais de 200 anos e não parece haver problema...], não estou a dizer que o sistema funcionou mal [pois, sendo assim...], mas há sinais de deterioração, de perda de qualidade e é natural que se pergunte [Quem se pergunta!?] em que é que pode melhorar. As crises antecipam-se e, se não formos capazes de atempadamente resolver os problemas que vão surgindo, corremos o risco de não ser capazes de evitar rupturas indesejáveis. 
Considera que “a representação proporcional é propícia à formação de governos minoritários e isso não estimula uma cultura de negociação e coligação”. Não é uma contradição nos termos? Parece acontecer o contrário...
Eu não atribuo a dificuldade de realização de consensos ao sistema proporcional, pelo contrário, ele favorece a consociatividade. A dificuldade de obtenção de consensos não está no sistema eleitoral. O que este provoca é, por um lado, o afastamento do cidadão do eleito – porque se votam listas de deputados escolhidos pelos partidos. Falta a pessoalização do voto [Não abriría a porta ao populismo!?], que é uma exigência crescente no sistema português. Por outro lado, o sistema eleitoral não favorece a governabilidade [Refere-se a Portugal!? Mas, tivemos 5 maiorias absolutas, 3 de um só partido, 2 em coligação, desde o 25 de Abril!!!]. Defendo um sistema misto, muito semelhante ao alemão [Quantos governos na Alemanha tiveram maioria absoluta de um só partido!?]
Quer explicar como é? 
Um sistema de círculos uninominais locais para metade do Parlamento [o que iria diminuir a proporcionalidade e a representatividade, pelo que sou contra] com eleição maioritária e um círculo nacional com voto de lista em eleição proporcional para a outra metade. Isso teria a vantagem de melhorar a proporcionalidade [Então, mas a proporcionalidade não é má!?], porque esta varia na razão da magnitude das circunscrições. Onde se obtém a melhor e a máxima proporcionalidade é num círculo nacional. 
Mas limita essa proporcionalidade à cláusula barreira de 3%, o que teria impedido, por exemplo, o Bloco de Esquerda de chegar ao Parlamento em 1999 (entrou com 2,4%), assim como o PAN (1,4%). Isso seria bom?
Não é necessariamente bom do ponto de vista representativo que haja uma grande proliferação de formações partidárias [Proliferação!? Na Assembleia da República!? Com 7 partidos representados, sem existir os tais 3%... Acha muito? Apesar da Grécia ter o mínimo de 3% e os extra 50 deputados para a lista mais votada, ainda assim entraram 7 partidos no Parlamento. O Parlamento alemão tem 5 partidos, mesmo com a barreira dos 5%, o Parlamento russo também tem a barreira dos 5% e tem 6 partidos, o francês 13, mesmo com os 5%, ou 15 na Bélgica...  Falasse da Espanha, da Itália, da Bélgica, da França e de muitos outros países e teria razão...]. A cláusula-barreira é uma forma de reduzir o excessivo fraccionamento do sistema de representação. [está demonstrado que não funciona] Precisamos de um sistema que equilibre representatividade com governabilidade sem excesso [chama-se DEMOCRACIA] de distribuição do voto. O sistema eleitoral deve favorecer soluções governativas. 
Afirma que a actual solução governativa “ao contribuir para um aumento de polarização do sistema político e da sua extremação, pode comprometer o crescimento” económico. Mas está a acontecer o contrário. Não acha que a acomodação do BE e do PCP no “arco da governação” reduz os extremismos?
O que quis sublinhar é que há forças políticas para as quais o crescimento económico não é uma prioridade, privilegiam outros objectivos. Em países com uma situação económico-financeira como o nosso, o crescimento é uma prioridade extraordinária, porque sem isso não podemos resolver o maior problema, que é a dívida. As soluções políticas devem satisfazer os grandes objectivos nacionais. [Isso bem explicadinho aos eleitores e o eleitorado fará essa leitura dos " objectivos nacionais"...]
Diz que foi instituído um semipresidencialismo do primeiro-ministro que tornou inoperantes os poderes presidenciais. Acha que o actual Presidente tem alterado esta situação no sentido de dar mais consistência aos seus poderes de influência, orientação, fiscalização e cooperação? 
Deixe-me clarificar: a fórmula presidencialismo do primeiro-ministro é uma ideia de Adriano Moreira durante as maiorias do PSD com Cavaco Silva. Na actual situação, eu acho que o Presidente da República não tem desrespeitado os seus poderes, tem-se mantido no estrito cumprimento dos seus poderes. Tem, sim, procurado reforçar o seu poder de influência através da proximidade com as pessoas. Mas não o tenho visto intrometer-se em domínios que não são os seus. Não havendo uma maioria absoluta, é evidente que o poder real do Presidente emerge. 
Propõe que se regresse ao modelo das duas câmaras, prevendo uma câmara alta com cerca de 1/3 dos actuais deputados do Parlamento e alguns lugares para inerências e nomeação presidencial. [Voltámos ao séc. XIX, a um sistema de inspiração monárquico e conservador!? Em que havia deputados não eleitos para garantir o que se puedesse do poder do clero e da nobreza!?] Porquê?
A nossa tradição é bicameralista. À excepção do Vintismo [BONS TEMPOS], sempre tivemos câmara alta, até à revisão constitucional de 1982 – até aí, o Conselho da Revolução desempenhava esse papel. O que fundamentalmente recomenda uma câmara alta seria uma maior qualificação legislativa [Como? Com exame de admissão a deputado!?], um controle parlamentar mais cuidado e poderia favorecer uma maior profissionalização da função parlamentar. Aliás, nós temos senadores - o que não temos é Senado -, e muito activos, a emitirem opiniões, a serem ouvidos pelos media, que estão disseminados e que poderiamos reunir com proveito para o sistema. [O Senado justifica-se em sistemas federais, onde os estados estão representados de forma igualitária no Senado, como contrapeso aos estados mais populosos que elegem mais deputados] 
Isso não retiraria funções ao Conselho de Estado, ao Tribunal Constitucional (TC) e até ao Presidente da República?
Isso não teria implicações nos poderes dos outros órgãos. Eu defendo até que o Conselho de Estado deveria ser reforçado nas suas competências. Existem Conselhos de Estado fortes na Europa em sistemas bicameralistas. [E são fraquinhos quando só há uma câmara?] E também não tinha de se beliscar [cá para mim quer mais que beliscar...] o TC. Aqui, o problema é outro: é a sua excessiva politização, sobretudo em termos de composição. Ganhava em ser um órgão mais independente do Parlamento e dos partidos, com mecanismos de designação como os demais tribunais. 
O modelo que propõe acaba com a eleição directa e universal do Presidente, impede-o de dissolver a Assembleia da República e impede esta de aprovar moções de censura sem ter um Governo alternativo, o que praticamente inviabiliza a dissolução do Parlamento…
Não. Por partes, porque a proposta é complexa. Em primeiro lugar, questiono se ainda faz sentido a eleição directa do Presidente. [Retiraría peso, legitimidade democrática ao cargo do PR, em países como a Alemanha ou a Itália, com o fim do nazismo e do fascismo, quis-se retirar importância ao PR, elegendo-o de forma indirecta para não. dar muito poder a um só eleito...] Foi uma decisão conjuntural que teve muito a ver com a necessidade de dotar de legitimidade democrática o vencedor do 25 de Novembro e civilizar a democracia [Agora que está civilizada, regresse a barbárie?]. Hoje a conjuntura é diferente e a eleição por sufrágio directo e universal, com campanhas em que se discutem modelos para o país, passa a ideia de que os presidentes vão resolver os problemas do país, quando o Presidente não governa [E tem procurado passar uma ideia diferente!?]. Além disso, há uma disparidade entre os poderes e a legitimidade do Presidente. Assim como não é bom ter poderes não legitimados, também não é bom ter uma legitimidade que não pode ser executada. Assim, ou presidencializamos ou parlamentarizamos o sistema. Eu sou favorável a uma maior parlamentarização. 
No actual sistema, é o voto universal que dá ao Presidente a legitimidade da dissolução da Assembleia. Com o modelo que propõe, esse poder desaparece? 
Não, o Presidente pode continuar a ter esse poder tendo uma legitimidade indirecta. Eu não proponho retirar esse poder ao Presidente, mas condicioná-lo à existência de outro governo. Pode haver governos minoritários… [contradizendo tudo o que tem afirmado, pondo a tónica na governbilidade, mau... organize as ideias]
Sem o poder de autodissolução e condicionando o Presidente a um novo governo, em que condições poderia haver a dissolução do Parlamento? 
Sempre que não houver maiorias de suporte desse Governo. A minha proposta não é inviabilizar, é condicionar o poder de dissolução, que hoje é pouco condicionado. 
Num tempo em que os cidadãos reivindicam mais participação na democracia, esta prioridade que dá à governabilidade não entra em confronto com as expectativas dos eleitores?
Penso que não. A democracia é um regime de mandatos. O que se pede de um Governo é que governe, tendo nós em democracia a possibilidade de, depois, pedir contas a esse Governo e de o julgar em eleições. O que se pede é que o Governo tenha força suficiente para impor o interesse público e o bem comum aos interesses particulares. As democracias mais consolidadas do mundo não têm governos derrubados a meio das legislaturas. 
Nos últimos 30 dos 41 anos desta Constituição temos mais governos que cumprem a legislatura do que derrubados no Parlamento... 
É, mas não quer dizer que não haja uma instabilidade provocada por forças políticas visando ou procurando levar o Presidente da República à dissolução ou à demissão. A possibilidade, este não condicionamento suficiente do poder de dissolução ou de demissão, é fomentadora da instabilidade política e dificulta a acção governativa. 
Qual seria a válvula de segurança de um sistema assim? 
A grande válvula de escape em democracia são as eleições periódicas: a possibilidade de os cidadãos julgarem quem governou e fazerem escolhas livres e periódicas. Tem de haver respeito pelos mandatos parlamentares. 
Este modelo que preconiza não é demasiado semelhante ao do Estado Novo? [Esta doeu...] 

Não, de todo. No Estado Novo tínhamos um sistema maioritário de lista, não tínhamos um sistema misto. É completamente diferente. [Existia um só partido legalizado, não havia eleições livres, as mulher não votavam... detalhes, detalhes] O sistema maioritário que eu defendo parcialmente no sistema misto é um sistema uninominal. O sistema de lista será para o círculo nacional, o que aumenta a proporcionalidade.
Eu referia-me ao modelo de duas câmaras, eleição indirecta do Presidente e reforço da governabilidade. (o Presidente na Grécia, entre outros países, é eleito de forma indirecta, não melhora a governabilidade por esse facto...)
A minha proposta não é uma política [bem me parecia, é muito  inconsistente], é um contributo académico para o debate. Eu estudo o sistema político há vários anos e considero que há melhorias a fazer, mas não tenho uma proposta fechada. São algumas ideias que merecem reflexão e que precisam de ser [muito] aprofundadas. 
O que pensa da proposta feita pelo líder parlamentar do PSD de atribuir mais 20 mandatos parlamentares ao partido mais votado nas eleições, em nome da governabilidade?
Essa é uma solução técnica que resolve o problema da governabilidade [Ai, sim? Na Grécia são 50 deputados e o problema da governabilidade não se resolveu, nem com um "prémio" de 50 deputados a mais garantiram governos de maioria absoluta...], mas não resolve os outros. A minha preocupação é favorecer equilibradamente as grandes questões do sistema actual. O que acho é que os partidos discutem muito entre eles e têm grandes clivagens, não chegando a um consenso.  
Uma reforma destas exigiria uma revisão constitucional, senão mesmo uma nova Constituição [Nesta parte a direita portuguesa suspira....]. Acha que há condições para isso? 
Nós continuamos muito limitados pelo quadro constitucional, que foi construído sob grande pressão. Já lá vão 43 anos do 25 de Abril, é tempo de mudar. Mas não sou defensor de uma ruptura constitucional, defendo uma reforma atempada. Quanto mais cedo a fizermos, mais podemos antecipar problemas e melhorar um regime que aprecio e estimo. O meu medo é esse: todos sentimos que há uma perda de qualidade da nossa representação, há cada vez mais gente a dizer que não se sente representado no Parlamento. Há o risco de um certo apodrecimento do regime. Há um grande consenso de que é preciso mudar, mas nem todos pensam no mesmo sentido. Mas o que mais me preocupa é não haver entendimento entre os dois maiores partidos. [Se é para isto, ainda bem...]
[Nem uma palavra sobre a regionalização... ] 
[Nem uma palavra sobre a limitação de mandatos... ]
[Nem uma palavra sobre o estatuto dos independentes, o qual deveria ser clarificado...] 

*Comentários por Luís Norberto Lourenço 

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