domingo, janeiro 22, 2006

Eleições presidenciais portuguesas de 2006: uma leitura possível



“Só é vencido quem desiste de lutar.” (Mário Soares, 22/01/06)



Quando faltam escrutinar os votos de duas freguesias onde houve boicotes eleitorais e os votos dos emigrantes, já não está em causa, nem a eleição à primeira volta de Cavaco Silva, nem as posições relativas dos seis candidatos à Presidência da República. (Ver resultados oficiais) *

Posso então fazer uma análise, não a sondagens ou a projecções e sim a resultados eleitorais, isto é, à vontade expressa da maioria dos eleitores portugueses. A vontade soberana (democrática, legitima e legalmente a única) do Povo, a qual a Constituição consagra.

Resultados: Cavaco Silva (50,59%), Manuel Alegre (20,7%), Mário Soares (14,3%), Jerónimo de Sousa (8,6%), Francisco Louça (5,3%) e Garcia Pereira (0,4%). Brancos: 1,06%
e nulos: 0,79%. Com uma abstenção de 37,4%.

Cavaco Silva foi eleito por 50,59% dos votos (60 mil votos separam os que o quiseram na PR e os que o rejeitaram… nunca um PR foi eleito por tão poucos votos). No entanto, 49,41% dos eleitores votantes rejeitaram este novo PR.

C. Silva, no discurso da vitória, agradeceu o apoio à Direita, ao PSD e ao PP (o tal partido que o enojara referir durante toda a campanha!). Deixou assim claro (se dúvidas havia), quem esteve com ele e quem com ele terá direito a beber champanhe.

O discurso de José Sócrates, Secretário-geral do PS e Primeiro-ministro de Portugal, foi um discurso politicamente inteligente e apaziguador, acolhendo os militantes e simpatizantes desavindos.

Da desunião à Esquerda, referi-me atempadamente**, dando o exemplo das últimas eleições presidenciais francesas.

Confesso que não acreditava que um candidato sem apoio partidário pudesse chegar a um resultado tão significativo como o que obteve Alegre, superando mais de 20% dos votos.

É um forte sinal cívico e esclarecedor, num cenário duma Democracia consolidada, tanto mais que não havia apoios de grandes grupos económicos por trás.

Cavaco Silva não representará nunca metade dos eleitores portugueses, aqueles que se dizem de Esquerda. É por isso que esta teria de ter sempre um candidato forte e mobilizador, unindo em seu torno todas as tendências políticas da Esquerda, do centro-esquerda à extrema-esquerda. E isso só seria possível com diálogo entre todos os partidos de Esquerda, antes de se colocarem as candidaturas no terreno. Sendo uma eleição apartidária, os apoios partidários são decisivos.

Não foi possível. Não foi possível, sobretudo, pela mesma razão que nunca haverá em Portugal uma Governo de Esquerda. O que temos, apoiado pelo PS, foi eleito por um eleitorado do chamado “centrão”, que vai centro-esquerda ao centro-direita e alguma esquerda.

Mário Soares ou outro candidato, em alternativa a C. Silva, deveria ter construído o apoio uma candidatura com processos de escolha democraticamente partilhados a partir da base e não sentidos como impostos pelo aparelho, pelos dirigentes partidários.

A Mário Soares devemos muito: a oposição ao Estado Novo (ditadura), a construção e consolidação da nossa Democracia, a fundação do PS e a adesão à CEE (hoje, UE). Devemos ainda, o nunca ter dito não a Portugal, quando o país chamou por ele.

No entanto, perdeu e estou triste por ele, porque não merecia tamanha derrota, parte dela, devendo-se à forma como em Portugal se encara a velhice, não como um poço de sabedoria e antes um fardo!

Nota negativa para a exclusão dos debates televisivos dum candidato a PR, Garcia Pereira.

Nunca me reverei numa democracia coxa.

O dia de reflexão, maldito para alguns, deve manter-se (pena que não se cumpra verdadeiramente e que a CNE não tenha poderes concretos para poder fiscalizá-lo, penalizando os infractores). Depois da campanha e duma longa pré-campanha eleitoral é salutar haver um para o eleitor reflectir. Não?

Parabéns ao STAPE pela rapidez com que nos forneceu os resultados.

Nota pessoal:

Sou militante do Partido Socialista desde 1994.

Fui um dos milhares de subscritores da candidatura de apoio a Mário Soares.

Estive no jantar de apoio a Mário Soares, em Castelo Branco, durante a pré-campanha.

Estive no comício de apoio a Mário Soares, em Castelo Branco, na campanha eleitoral.

Participei nas várias reuniões partidárias enquanto militante socialista: na secção, na concelhia e no plenário distrital de militantes de Castelo Branco. Ouvi e fiz-me ouvir.

Mais importante do que tudo, exerci o meu direito de voto, votando em Mário Soares.

Cumpri como militante o meu dever, estando presente nos momentos decisivos.

Como agente cultural, no quadro das iniciativas da Casa Comum das Tertúlias, dei um modesto contributo para o esclarecimento dos eleitores, ao disponibilizar em locais públicos uma pasta com os manifestos eleitorais dos candidatos à PR. ***

Cumpri como cidadão o meu dever, votando. Comprometendo-me, sabendo que um voto só vale isso mesmo: um voto. Apesar disso quis votar.

A democracia não se esgota no “centrão” que dá vitórias e não perceber isto é não perceber nada. Excluir os ditos “radicais”, atirando-os para fora do sistema democrático, o qual combaterão marginal e clandestinamente, é armar os inimigos da Democracia.

Teremos todos cumprido as nossas obrigações?

Luís Norberto Fidalgo da Silva Trindade Lourenço

Castelo Branco, 22 de Janeiro de 2006

* Resultados oficiais:

· S.T.A.P.E. – http://www.stape.pt

o http://www.presidenciais.mj.pt/html/ISD23.html

· C.N.E. – http://www.cne.pt

** http://luisnorbertolourenco.blogs.sapo.pt/arquivo/769666.html

*** http://fanzinetertuliando.blogspot.com/2005/11/iniciativa-cvica-da-cct-presidenciais.html

P.S.

Notícias internas:

http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1245550&idCanal=33

Reacções lá de fora: http://www.elpais.es/articulo/elpporint/20060123elpepuint_1/Tes/internacional/Victoria/holgada/Cavaco/Silva/primera/vuelta/presidenciales/Portugal

1 Comments:

Blogger Luís Norberto Lourenço said...

O artigo de opinião também foi publicado no "Porta da estrela":
http://www.portadaestrela.com/forum/message.asp?IdMsg=3944&IdForum=1#m3944

11:30 da manhã  

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